Arco-íris
Foi como a chegada de um temporal. Eu senti o vento gelado bagunçando o meu cabelo e me arrependi de não ter pegado um casaco. Levantei a cabeça, vi o céu escurecendo e me arrependi por não pegar um guarda-chuva. Pouco tempo depois, os primeiros pingos de chuva tocaram os meus braços e eu me arrependi de não ter ficado em casa. Me abriguei no primeiro lugar coberto e seguro que achei e fiquei lá até o temporal passar.
Demorou. Por alguns minutos cheguei até a pensar que não iria passar e que eu estava fadada a passar o restante dos meus dias em uma loja esquisita, com roupas horrorosas. Já sem esperanças de sair dali tão cedo, peguei o celular e procurei algo para me distrair, mas a internet simplesmente se recusava a funcionar. Perdido entre meus zilhões de aplicativos, estava um jogo que eu havia baixado há meses e nunca tinha parado para abrir. Resolvi dar uma chance para ele, afinal, ele não poderia estar ali por acaso, né? Depois de quase uma hora sem desgrudar meus olhos da tela, espiei pela porta e vi um sol forte brilhando lá fora. Se não fosse pelo asfalto molhado e pelas gotas de água que ainda caíam das árvores, ninguém poderia dizer que tinha chovido tanto.
Isso me lembrou o dia em que você chegou na minha vida. Tive um pressentimento que iria me machucar, mas ignorei minha intuição e resolvi te dar uma chance. Comecei a ouvir atentamente as coisas que você dizia e percebi que não tinha como a gente acabar bem, mas escolhi me iludir, pensando que um de nós poderia mudar ao longo do tempo. Parei de me ver sempre como a errada e apontei suas atitudes que mais me incomodavam, mas você sempre revertia a situação e fazia eu me sentir a pior pessoa do mundo apenas por ser diferente de você.
Durante todo esse tempo, procurei algum lugar seguro para nós. Evitava assuntos delicados para nós, mas eu não conseguia ser exatamente quem eu era com você, justamente por saber que você não gostava do meu jeito. Eu até tentei ser como você queria que eu fosse, mas a verdade é que esse lugar não era nem um pouco seguro para mim. Quanto mais eu tentava ser quem você queria que eu fosse, mais eu me perdia de mim mesma. E não tem como ficarmos seguros fingindo ser quem não somos.
Então decidi enfrentar o temporal que era deixar você e seguir em frente. Em meio a chuva, raios e trovões. Por vezes pensei em desistir. Todas as vezes que eu te via, era como olhar para trás e ver um lugar seguro para me proteger do caos que eu estava enfrentando. Mas eu não conseguia me esquecer do tanto que precisei me anular para estar com você, do quanto me sentia insuficiente apenas por ser quem eu era de verdade. Se esse era o preço para ter um pouco de proteção, então era caro demais. Virei o rosto na direção do vento forte e continuei.
Quando pensei que o temporal não iria acabar mais, encontrei alguém que eu não via há muito tempo. Ali. Parado. Com um guarda-chuva simples nas mãos, mas disposto a dividi-lo comigo. Parecia que aquele guarda-chuva não iria aguentar a intensidade da chuva, nem a força dos ventos, mas resolvi arriscar. Caminhei alguns poucos metros com aquela pessoa e vi que estava dando tudo certo. Eu não estava me molhando mais, o vento já estava secando o meu cabelo úmido e, apesar de não ser como eu havia idealizado, comecei a achar que aquilo era uma boa proteção.
Começamos a conversar sobre assuntos que não falávamos há tempos e a conversa não acabava mais. Pela primeira vez em muito tempo me lembrei de como era gostoso poder ser eu mesma. Sem precisar medir as palavras, sem ter vergonha de mim. Acho que andamos quilômetros, mas eu nem percebi, pois o tempo voou e minhas pernas não doeram nem um pouco. Coloquei o rosto para fora do guarda-chuva e vi que a chuva tinha passado e o sol já estava de volta, imponente como sempre.
Parei e olhei para trás. Lá, no final do horizonte, eu te vi. Parado, sério como sempre. Senti uma nostalgia de tudo o que vivemos, mas agora, sob a luz do sol, consegui ver os detalhes que meus olhos molhados não me permitiram ver antes. Você não era um abrigo seguro. Você era apenas uma cobertura provisória que me deixa ainda mais exposta e sem proteção nenhuma. Quando olhei para você, agora vivendo no meu passado, vi que o medo de enfrentar o temporal me fez pensar que você poderia ser a melhor escolha e que eu deveria ter ficado ali. Presa. Parada. Estagnada. Desperdiçando meu tempo e quem eu sou.
Não foi nem um pouco fácil enfrentar o temporal. Eu senti frio, medo e achei que não chegaria a lugar nenhum. Continuo caminhando, mas, graças a você, eu percebi que não dá para viver na ilusão, com uma falsa segurança que, na verdade, nunca existiu. Um pouco de coragem é o que foi necessário para eu trilhar esse caminho, encarando os meus maiores medos. Um pouco de coragem foi o que me mostrou que, no final das contas, enfrentar um temporal me deixou muito mais feliz do que todas as horas que passei com você, tola, achando que isso era um dia ensolarado.
Daqui, a quilômetros de distância de você, eu te digo: obrigada! Obrigada por me mostrar que sou uma pessoa incrível e que o problema estava em você, que nunca esteve pronto para enfrentar sequer uma garoa fina ao meu lado. Agora escolho virar as costas para você e te bloquear da minha vida. Sim, eu escolho me livrar do arrependimento de ter traído minha intuição e ficado tanto tempo insistindo em algo que eu sabia que não daria certo, no final das contas. Chegou a minha hora de aproveitar o caminho, com um sol lindo e brilhante. O mesmo sol que me permitiu enxergar o quanto mereço mais. Eu mereço o pote de ouro que está no final do arco-íris e hoje sei que você nunca conseguiria chegar comigo até lá!
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